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Foto do escritorGabriela Azevedo

Em meio a quarentena, por que os jovens se arriscam em “rolês” e festas clandestinas?

Começo esse texto lembrando que ainda estamos em quarentena e em isolamento social, em algumas partes do país com alguma flexibilidade e em outras com maiores restrições. E todos se surpreenderam com um grande número de “rolês” (encontros e baladinhas para quem é da minha época!) e festas clandestinas (sim, clandestinas porque aglomerações estão proibidas) promovidas por jovens.


Como era de se esperar, o número de casos de Covid subiu de maneira alarmante, e o número de jovens infectados também.


Mas afinal, o que explica este comportamento dos jovens?


Trago uma reflexão, sem nenhum propósito de julgar, sobre algumas motivações que poderiam explicar essas transgressões.



Temos que lembrar que o cérebro do adolescente e do jovem está em formação e a região responsável pelo julgamento e controle de impulso, o córtex pré-frontal, só alcança sua maturidade próximo aos 25 anos. Consequentemente, a avaliação de riscos também está implicada nesse processo e a reação impulsiva evidente também.


Assim, a adolescência se torna uma fase em que ocorrem os maiores comportamentos de risco e as situações de imprudência. Ao contrário dos adultos, os adolescentes tendem a buscar recompensas imediatas, prazer imediato. Isso já nos leva a uma pequena compreensão do cenário, mas além do desenvolvimento cerebral, há ainda aspectos sociais e emocionais sobre os quais vale a pena nos debruçar.


É difícil ficar de fora!


A adolescência são os anos de transição entre a infância e a vida adulta, nesse período o jovem não tem mais a proteção constante que recebia dos pais durante a infância, mas ainda não conquistou a segurança e a independência do adulto. É no grupo, com seus pares, que ele encontra apoio e sensação de proteção. São os amigos que dão ao adolescente a sensação de fortalecimento, e estar fora do grupo provoca insegurança e vulnerabilidade.


Nesta fase a identidade está sendo construída e a percepção do que ele é capaz não é plena, com isso, o adolescente sente necessidade de experimentar, descobrir suas habilidades e interesses.


Percebemos, então, que a quarentena vai na contramão do que o jovem busca. Ele está privado de ter vivências que favoreçam o autoconhecimento e está longe de seu grupo de amigos.


Descontrole de limites


Em uma entrevista, o psiquiatra Ricardo Krause refletiu sobre o descontrole de limites que todos vivemos durante a pandemia. Perdemos o controle sobre o tempo de tela e, sem dúvida, muitos mudaram o horário do sono, outros passaram a consumir mais álcool ou mudaram hábitos alimentares.


Com os adolescentes não foi diferente, observamos diversos limites sendo extrapolados. Do compromisso em assistir às aulas online, ao tempo de videogame e horas de sono, tudo foi mudando ao longo dos meses, somado à solidão vivida por eles.


Sem dúvida que WhatsApp e redes sociais cumprem um papel de aproximar e conectar as pessoas, no entanto, para o jovem eles são vistos como o confronto constante do isolamento vivido. Em consultório um jovem me disse que o relacionamento por meio da rede social era “uma maneira fria de demonstrar calor”. Distantes uns dos outros, os adolescentes se sentem esvaziados de emoção.


Pais resignados


Os pais sensibilizados por verem seus filhos extenuados com o isolamento, permitiram que eles se aproximassem de seus amigos. Inicialmente, era apenas para ver um amigo com máscara e em local aberto. Mas logo as máscaras foram tiradas, o espaço foi fechado e mais alguém convidado. E, de maneira talvez sorrateira, os encontros foram ganhando corpo.


O grupo logo voltou a se reunir. Juntos se sentiam fortes e novamente onipotentes. Juntos se sentiam capazes e protegidos. Mas não contra o Corona vírus. É fato que os jovens, em sua maioria, não desenvolvem a doença em sua forma grave, mas transmitem o vírus para aqueles que desenvolverão.


Sabemos que faz parte da adolescência extrapolar limites, transgredir, confrontar os pais. Então, cabe aos adultos circunscrever limites aos filhos. Por mais que se sintam contrariados, os adolescentes precisam sempre ser lembrados de que existe a liberdade pessoal mas existe a responsabilidade social, ou seja, não pode haver decisão individual, quando a consequência é coletiva.



Gabriela Azevedo é psicóloga com mestrado em Comportamento do Adolescente, psicoterapeuta de adultos e adolescentes, e especialista em programas de carreira.

www.gabrielaazevedo.com.br


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