Geração Z trata trabalho como um "date" que não deu certo
- Gabriela Azevedo
- 18 de mar.
- 3 min de leitura
Atualizado: 20 de mar.
Jovens levam o comportamento de "ghosting" do universo dos encontros para o ambiente corporativo, sem avaliar consequências para construção de sua carreira.
Uma pesquisa realizada pela Indeed no Reino Unido com jovens, com idade entre 18 e 24 anos, trouxe dados surpreendentes sobre o comportamento da Geração Z no mundo do trabalho.
Imagino que muitos já ouviram a expressão em inglês “ghosting”. Mas para quem não está familiarizado, o "ghosting" se popularizou no contexto dos relacionamentos e acontece quando uma pessoa, de forma repentina e sem explicação, para de responder ou desaparece completamente da vida da outra.
A pesquisa mostrou que a Geração Z tem adotado esta postura audaciosa também no cenário profissional. Dos entrevistados, 93% afirmaram não ter comparecido a entrevistas marcadas e 38% sumiram durante as interações com a equipe de recrutamento, optando por ignorar mensagens.
De acordo com eles, uma das razões seria a reciprocidade, já que em algum momento empresas não deram retorno às suas candidaturas. Outro motivo seriam salários não atrativos.
Indo além, o “ghosting” não acontece somente no processo seletivo, ele é praticado também depois da contratação. Segundo a pesquisa, 87% já faltaram no primeiro dia de trabalho e 23% da Geração Z entende que não há problema em deixar um emprego sem aviso prévio, seja quando enfrentam algum impasse ou quando algo não faz sentido para eles.

Uma análise
Independentemente da conduta da empresa, que eventualmente precisa de fato melhorar processos, fiquei preocupada pela falta de percepção do jovem sobre o impacto que os comportamentos acima possam gerar na construção de seu ethos e de sua carreira. E acredito que a responsabilidade não seja apenas deles, mas dos adultos do entorno também.
A Geração Z cresceu com tudo à mão e com a expectativa de gratificação instantânea. Com isso, muitas vezes não conseguem enfrentar desafios que exijam esforço contínuo ou paciência.
No ambiente de trabalho, a necessidade de resultados rápidos pode levar ao abandono quando se deparam com atividades que parecem difíceis ou demoradas. Desmotivados, eles simplesmente não aparecem mais.
Outro aspecto é a baixa tolerância à frustração. Conflitos, impasses, feedbacks também são razões para não retornarem às suas mesas, muitas vezes por não saberem como lidar com a situação.
Como abordo no meu Guia para Pais, deixar o filho se frustrar na infância e na adolescência é fundamental. É um aprendizado para que ele saiba suportar e contornar situações em que for contrariado ou frustrado, inclusive no mundo adulto.
Saber se posicionar, questionar, negociar e renegociar também são aprendizados importantes, que os pais devem estimular sempre em seus filhos ao longo do seu desenvolvimento. O "não brinco mais" e o "estou de mal pra sempre" só cabem na primeira infância.
As empresas precisam repensar o onboarding desta nova geração, oferecendo orientações objetivas, discutindo a construção da imagem profissional e, também, proporcionando um espaço de escuta. Com isso, poderão intervir de maneira efetiva diante da percepção que os jovens têm de desafios no ambiente corporativo e contribuir no desenvolvimento de profissionais mais preparados para a realidade do mercado.
Precisamos ajudar nossos jovens a se tornarem adultos seguros, independentes e preparados para lidar com os imprevistos da vida, e também com os encantos!
Leia mais dados da pesquisa do grupo Indeed clicando aqui.
Gabriela Azevedo é psicóloga pela PUC-SP, com mestrado pela Faculdade de Medicina da USP, atua clinicamente e como orientadora de carreira atendendo adolescentes e adultos.
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