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Foto do escritorGabriela Azevedo

A solidão dos adolescentes na superconexão

Atualizado: 14 de out. de 2020

Por que nossos adolescentes, mesmo sendo parte da iGen – a geração superconectada - se sentem sozinhos?


“Tenho me relacionado com notificações” - assim um adolescente começou sua sessão em meu consultório, lamentando o quanto os relacionamentos têm acontecido por mensagens e redes sociais. Podemos atribuir esta fala ao momento especial que vivemos, à pandemia, mas o fato é que esta sensação já era comum aos adolescentes antes mesmo da quarentena.


Em pesquisa realizada, a psicóloga Jean Twenge* evidenciou que 31% dos adolescentes se sentem sozinhos. Embora sejam parte de uma geração de jovens plugados, os adolescentes têm se sentido solitários justamente por esta superconexão. Sim, eu sei, parece contraditório.


Para começar a falar sobre o assunto vou trazer um filme, que assisti na década de 90, chamado “Denise está chamando”. Quando assisti ao filme, ele me gerou muita angústia e me lembro dele até hoje. O filme mostra 7 jovens que se conhecem ou tem conhecidos em comum, mas ao longo do filme nunca se encontram, embora todos os encontros pudessem acontecer. As relações presenciais são substituídas por contatos telefônicos e o sentimento de solidão paira no ar ao longo de todo o filme. É apresentado um mundo “pré-virtual”, que em muito me lembra o que se vive atualmente.


Seres sociáveis desde os primórdios


Nós, humanos, somos seres que vivemos em comunidade desde nossos ancestrais mais primitivos. Se algum de nossos antepassados, por qualquer razão deixasse seu bando, dificilmente sobreviveria sozinho.


Por sermos muitos sociáveis criamos, então, as redes sociais para que pudéssemos nos conectar ainda mais uns aos outros. Mas, para nossa surpresa, são justamente estas redes que também nos afastam. E nesta ambiguidade o adolescente é pego por incertezas.



Por que as redes afastam?


As redes sociais se tornam solos férteis para sentimentos de rejeição. O adolescente em sua vulnerabilidade, característica da fase, fica suscetível às postagens porque sempre há um descompasso nesta forma de comunicação.


O que você escreve será lido com a mesma entonação? Terá a mesma compreensão? E se não for respondido, tão logo foi escrito? Os adolescentes ao postarem, anseiam por uma reação de seus amigos, mas se ela não vem como esperado, logo surge a dúvida: “por que não curtiram minha postagem? O que fiz de errado?”.


Além dos próprios posts, as imagens com as quais os adolescentes se deparam também podem provocar sentimentos de exclusão, como o story de um momento em que ele não estava presente, uma selfie de uma festa para a qual ele não foi convidado.


O que no passado era um cochicho no corredor que você ouvia sem querer, para os adolescentes de hoje é muito mais ostensivo, são fotos e vídeos postados em tempo real de colegas se divertindo. E tão logo o jovem passa pela imagem, já se sente mal. Em inglês já existe inclusive uma expressão para isso: FOMO - Feeling of Missing Out (sensação de ser deixado de lado). Como comentou a pesquisadora da Universidade de Cornell (EUA) Janis Whitlock “os adolescentes estão num caldeirão de estímulos do qual não conseguem sair”.


A comunicação por whatsapp tampouco ajuda. Ao enviar uma mensagem, o jovem espera uma resposta. Se ela vier prontamente, a sensação de bem-estar vem junto. No entanto, por vezes esta resposta não vem rápido, ou simplesmente não vem. Com isso, o nível de ansiedade aumenta e a sensação de desamparo também.


Por fim, um outro aspecto não menos importante é o uso dos emojis. Essas carinhas simpáticas são divertidas, e isso ninguém pode negar. Mas elas não têm contribuído para que os adolescentes falem sobre seus sentimentos ou reconheçam os dos outros.


Ao invés de falar que estão chateados por esta ou aquela razão, enviam um rosto triste, bravo ou até furioso. Se gostam, segue uma cara feliz. E para os apaixonados, há algumas com coração. No entanto, as emoções que sentimos transcendem os 50 emojis disponíveis em nossos celulares.


Não restam dúvidas de que quanto mais tempo os adolescentes passam nas telas, menor é a sua interação social e maior é a sua solidão. Com urgência, passada a pandemia, precisaremos estimular a troca entre os jovens, propiciar encontros e reencontros, afinal as memórias são criadas a partir de experiências vividas, olhos marejados, caras fechadas, narizes torcidos, sorrisos dados!



Gabriela Azevedo é psicóloga, com mestrado em Comportamento do Adolescente, psicoterapeuta e especialista em programas de carreira.



*Pesquisa referência: iGen – Jean Twenge – Ed. nVersos

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